segunda-feira, 6 de dezembro de 2021

E pioram mais...

Recentemente participei de uma formação on-line e, em um dos pontos da formação, foi apresentado um gráfico que relacionava o Nível Socioeconômico (NSE) das escolas com seu resultado no IDEB (não vou reproduzir o gráfico aqui por conta de direitos autorais).


Foi traçada uma linha de tendência com os dados do gráfico e esta linha indicava uma correlação positiva entre os dados (IDEP vs NSE), o que também podia ser observado qualitativamente pela distribuição geral dos dados.

Agora uma lista de ressalvas:
1- Como sempre é possível traçar uma linha de tendência, ela não é suficiente para extrair conclusões sólidas sobre os dados, ela apenas mostra a tendência.
2- Existem ferramentas de análise de dados que podem ajudar a entender a reta de tendência, como o Coeficiente de Pearson.
3- Seria interessante uma análise prévia dos dados, talvez traçar a linha de tendência a partir das médias dos resultados do IDEB para um dado NSE.

Após as ressalvas podemos voltar ao cerne da questão: Se você optou por traçar uma linha de tendência, respeite-a.

E é claro que isto foi exatamente o que não foi feito com o gráfico mostrado. Como a intenção era indicar justamente que o NSE não influênciaria o resultado do IDEB escolheu-se pinçar, malandramente eu diria, dois dados que corroboram a hipótese. Nem preciso dizer o quanto isso é errado.

Mas vou dizer, isto é muito errado, metodologicamente e eticamente errado.

Prefiro focar na questão metodológica e imaginar que a questão ética foi "não-intencional", porque esta postura me poupa problemas.

Metodologicamente falando, a prática de pinçar dados que provem sua hipótese é conhecida no meio científico e é considerada uma falácia argumentativa conhecida como supressão de evidências. Ela ignora todos os dados que podem mostrar a falha no argumento e, no caso específico, a linha de tendência que os próprios dados mostram.

No fundo eu realmente acredito que o erro foi cometido mais por uma incompetência metodológica do que pela necessidade de provar um ponto. Acredito que os escritores no texto não viram problemas técnicos em fazer isto, mas espero que tenham, pelo menos, tido uma coceira moral. Mas isto não tenho como saber.

Enfim, foi mais um desabafo mesmo, que se alinha perfeitamente com o post anterior, e me leva a pensar que: se nossos profissionais do ensino não sabem nada sobre metodologia científica como podemos cobrar da nossa sociedade iletrada que respeite a ciência, que saiba que Terra não é plana e que a vacina não te transforma em jacaré (ou causa AIDS).?

É isso aí...

Post Scriptum

Por sacanagem fui estudar o relatório PISA 2018 disponível no site do INEP e os seus estudos, muito melhor estruturados, indicam uma correlação direta entre o nível socioeconômico e o nível de desempenho em leitura.